José Macedo de Araújo nasceu por volta de 1895 na vila de Barcos, no concelho de Tabuaço, em Viseu, Portugal. Era filho de meu avô Antonio e de sua primeira mulher Eliza de Macedo. Era também o filho – homem – mais velho quando meu avô chegou com a mulher e seus sete filhos ao porto de Santos, no estado de São Paulo, em 14 de abril de 1905. A família se estabeleceu na vila de Maxambomba, atual Nova Iguaçu, estado do Rio de Janeiro.

José Macedo, desde bem jovem, demonstrou uma natureza empreendedora e saiu da casa do pai para tentar a vida com o irmão Antônio, dois anos mais novo, que morreu pouco depois de tuberculose. Com um empréstimo de Vasco de Macedo, irmão de sua mãe e também seu padrinho, José seguiu em frente e comprou um sítio, tornando-se agricultor.

Até aqui, narrei a trajetória de vida de meu tio a partir das pistas encontradas em um registro de desembarque e em um relato que me foi enviado por um primo. Deste ponto em diante, narrarei o que descobri de sua trajetória a partir do que dele se falou nos jornais, entre as décadas de 1920 e 1960, que foram encontrados em pesquisa na base de dados Hemeroteca Digital.

Em 1929, quando deveria ter 34 anos, José Macedo demonstrava estar plenamente integrado à vida cultural da “adiantada estação de Nova Iguaçu”. Segundo a edição de 6 de janeiro do jornal A Crítica (p. VI), ele era procurador do bloco carnavalesco Comtigo Eu Posso, que “deu o grito de carnaval na rua”, em 1º de janeiro, mobilizando “as meninas mais bonitas e elegantes para poder assim apresentar tudo digno de se ver”.

A Crítica – 6/01/1929

Já na edição do dia 9 (p. VI), ficamos sabendo que Maximiano de Macedo, outro irmão de sua mãe, era membro da comissão de carnaval desse bloco, que contava com o apoio do comércio e das famílias locais para apresentar um “carnaval digno daquella população em franco progresso”.

A Crítica – 9/01/1929

Na década de 1930, já encontramos José como um agroempresário reconhecido, pois a edição do Jornal do Brasil de 10 de janeiro de 1930 seu nome é relacionado entre os exportadores de laranja – cultura que marcou a economia local. Segundo relato da já citada carta, José teria viajado à Argentina para negociar seus produtos.

Jornal do Brasil – 10/01/1930

Na edição de 25 e 26 de maio de 1931, foi publicado o texto do telegrama expedido ao Sr. Interventor Federal no Estado do Rio de Janeiro contendo moção de apelo “para o patriotismo impoluto de Plínio Casado, para que continue a honrar o Estado com a sua chefia administrativa.” Assinam o telegrama o “agricultor e exportador” José Macedo de Araújo e inúmeros representantes da “sociedade de Iguassu” (sic).

Por ter adquirido “prédios á estrada Nazareth n. 20, frente fundos, por 25:000$000”, José Macedo tem seu nome relacionado entre dos “que adquiriram immoveis” no Correio da Manhã de 7 de fevereiro de 1931. Já na sessão de 8 de setembro de 1931 da Junta Comercial do Rio de Janeiro, ficou registrada a sociedade solidária de Gabriel Cruz e José Macedo de Araújo na firma Da Cruz & Araujo, comércio de padaria e confeitaria situado na estrada Nazareth n. 24, com capital de 40:000$000, conforme publicado no Correio da Manhã de 10 de setembro. José era literalmente um homem de variados negócios.

Correio da Manhã – 10/09/1931

A estrela de José Macedo deve ter brilhado nos céus em janeiro de 1935, pois, segundo o jornal A Nação do dia 16, sua apólice de seguros foi sorteada em dinheiro (em vida) no 114º sorteio, feito no dia anterior, pela Equitativa dos Estados Unidos do Brasil. José era não apenas um homem empreendedor, mas também um homem de sorte.

A Nação – 16/01/1935

Em 1936, segundo aviso publicado no Jornal do Brasil em 14 de junho, José Macedo dava mais uma prova de seu empenho empreendedor ao buscar autorização para construir um posto de gasolina no número 798 da já conhecida Estrada do Nazaré.

Seu “commercio de gasolina, etc.”, com capital de 3:000$000, no endereço citado antes, é divulgado no Correio da Manhã de 18 de abril do ano seguinte.

Correio da Manhã – 18/04/1937

Às vésperas da década de 1940, pouco após o mundo entrar novamente em guerra, José ampliava seus negócios no comércio de combustíveis ao adquirir de Nestor P. Simões uma “Bomba de Gazolina e Accessorios para Automoveis” na rua Marechal Floriano n. 340, no centro de Nova Iguaçu, conforme declaração publicada no Jornal do Brasil de 31 de março.

Podemos imaginar que José foi sábio em diversificar seus negócios, pois a cultura da laranja entraria em decadência a partir da década seguinte em função de problemas logísticos, de uma praga e da falta de apoio dos governantes aos agricultores. Nova Iguaçu, que chegou a ser conhecida como cidade perfume por conta de seus laranjais em flor, se tornaria conhecida como cidade dormitório.

Com relação a esse mesmo ano, descobri pela Gazeta de Notícias de 14 de dezembro que José Macedo era proprietário de um prédio no número 5.330 da Avenida Automóvel Club, na Pavuna, o qual era vizinho ao lote de um terceiro que teve seus bens penhorados conforme edital de arrematação publicado nesse jornal.

Gazeta de Notícias – 14/12/1939

A sorte de José parece ter mudado no início da década de 1940, pois, conforme anúncio no Jornal do Commercio de 10 de maio de 1941, ele sofreu uma ação de desapropriação movida pela União. A razão que teria motivado tal ação não é conhecida, da mesma forma que não é declarada a propriedade a ser desapropriada.

Jornal do Commercio – 10/05/1941

Em meados dessa década, José Macedo já teria vendido uma área de terreno de 7.282,50 metros quadrados na Estrada Velha da Pavuna. A escritura teria sido lavrada em 6 de setembro de 1943, segundo consta no Relatório da Diretoria da Companhia Federal de Fundição publicado em 22 de março de 1945 no Correio da Manhã.

Correio da Manhã – 22/03/1945

A década teria ao menos um fato positivo, segundo O Jornal de 14 de março de 1948, pois José Macedo e senhora casariam seus filhos Luiza e Waldir no sábado, 20 de março, com cerimônia religiosa na residência, na rua dr. Tibau, 102. Este com a senhorita Iraci Coelho Guimarães, aquela com o jovem José Ferreira.

O Jornal – 14/03/1948

Em 1949, nova desapropriação, desta vez movida pela Prefeitura do Distrito Federal de terrenos na Praia de Maria Angu, hoje Ramos, no subúrbio carioca, onde havia um porto para desembarque da produção agrícola destinada à cidade. O edital foi publicado n’O Jornal de 22 de novembro.

O Jornal- 22/11/1949
Porto de Maria Angu – ca. 1930

Apesar das desapropriações da década de 1940, sabemos que José Macedo ainda era dono de grandes extensões de terra no fim da década seguinte. O aviso de um leilão judicial publicado n’O Jornal de 27 de abril de 1958 informa que José Macedo e seu pai Antônio Pinto, meu avô paterno, possuíam terrenos às margens da Avenida Presidente Dutra – conhecida como Rio-São Paulo – na altura dos quilômetros 24 e 25 no sentido São Paulo.

O Jornal – 27/04/1958

Na década de 1960, já após a tomada do poder pelos militares, temos a informação de que José Macedo foi vítima de aproveitadores que lhe compraram grande extensão de suas terras por valor irrisório. Esse fato foi discutido em outro texto e pode ser lido aqui também em publicação do Diário de Pernambuco de 24 de maio de 1964.

Diário de Pernambuco – 24/05/1964

Em sua trajetória, repercutida por várias décadas em diferentes jornais, percebemos que o português José Macedo não teve dificuldade para se integrar na cultura brasileira. Aqui ele cresceu, teve participação em um dos principais eventos culturais da nação, empreendeu e criou seus filhos. Por tudo isso o episódio de que foi vítima na década de 1960 se torna ainda mais chocante.


José de Araújo é linguista e genealogista.


José Araújo

Genealogista

8 comentários

Genealogia Prática - Julgamento · 15 de dezembro de 2017 às 21:39

[…] Esse parente foi José Macedo de Araújo, tio paterno, meio-irmão de meu pai e um homem sob muitos aspectos empreendedor e que, por essa razão, deveria ser alvo de enorme admiração por parte de seus irmãos. Tanto é assim que se atribui a essa admiração a escolha de meu primeiro nome. Personagem tão importante em minha história pessoal não poderia ficar fora de minhas pesquisas, portanto dediquei a ele, até o momento, dois textos (leia aqui e aqui). […]

Genealogia Prática - Póstuma · 28 de janeiro de 2018 às 08:44

[…] Seria apenas a primeira iniciativa dele, que mais tarde compraria mais terras e se tornaria um dos citricultores que tornaram a região um grande centro produtor e exportador de laranjas. Esse filho ainda teria […]

Genealogia Prática - Anarquista · 4 de outubro de 2018 às 07:28

[…] referências ao alfaiate Maximiano de Macedo (1873-?), o qual acredito ter sido o tio e sogro de José Augusto de Macedo Araújo, meio-irmão de meu pai de quem herdei o primeiro nome em […]

Genealogia Prática - Memória · 21 de fevereiro de 2019 às 20:22

[…] Brasil: a primeira em 12 de maio de 1928 com José Augusto Macedo de Araújo, sobrinho de seu pai e meio-irmão de meu pai; a segunda em 6 de janeiro de 1923 com Benjamin Alves Teixeira. Ambas faleceriam sem deixar […]

Antônio – Genealogia Prática · 12 de junho de 2020 às 08:17

[…] Enéas Pereira Belém, grande amigo da família que editava o jornal, e José Macedo de Araújo, empreendedor de origem portuguesa e meio-irmão de meu pai, a quem devo meu primeiro […]

Póstuma – Genealogia Prática · 12 de novembro de 2020 às 09:31

[…] nos sustentaria, como havia sustentado nossa família lá em Portugal. Alguns anos mais tarde, José Augusto, meu filho mais velho, com grande espírito empreendedor, decidiu tentar a vida por conta própria […]

Irineu – Genealogia Prática · 9 de agosto de 2022 às 10:36

[…] O primeiro deles era meio-irmão de meu pai e foi em sua homenagem que recebi meu prenome. Já contei sua história aqui no blogue. O segundo é alguém mais distante em termos genealógicos, mas gosto de me referir a ele como um […]

Factos-1 – Genealogia Prática · 29 de agosto de 2022 às 07:55

[…] Finalmente, podemos falar da herança de prenomes. Era comum no passado que um(a) primogênito(a) recebesse o prenome de seu avô ou avó. O primeiro de meus tios-avós a nascer – Pedro Pereira Belém -, filho de João Pereira Belém e Theodora Maria da Conceição, parece ter recebido o nome de seu avô – o Pedro Gomes de Moraes já mencionado -, o que pode ratificar a filiação de seu pai. Igualmente interessante é o caso de dois dos filhos conhecidos de meu duodecavô Duarte Nunes – Antônia Rodrigues Sardinha e Domingos Nunes Sardinha. Domingos teve ao menos quatro filhos com sua mulher Maria da Cunha. Um deles – Duarte Nunes da Cunha -, talvez o primogênito, parece ter recebido o nome do avô paterno e sobrenomes combinados dos pais. Outros dois – Domingos da Cunha e Maria da Cunha – parecem ter recebido os nomes dos pais e da mãe e apenas o sobrenome da mãe. A última – Antônia Tavares de Oliveira – recebeu nome e sobrenomes de origens desconhecidas, talvez herdados de uma avó materna. A herança do prenome de um tio também era possível se ele fosse alguém da admiração dos pais da criança nomeada, por exemplo. Meu prenome, por exemplo, foi dado em homenagem a um tio – meio-irmão de meu pai – de quem já tratei aqui no blogue. […]

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