O doutor médico José Pinto do Souto (?-1842) é um personagem interessante de minha árvore genealógica: foi pai do bacharel José Pinto Rebello de Carvalho (1788-1870), exilado durante a Guerra Civil por resistir à causa absolutista de d. Miguel, irmão de Pedro IV (Pedro I do Brasil); foi pai do tenente Caetano Pinto Rebello (1792-1876), que serviu com as forças leais a Pedro IV na guerra pelo liberalismo constitucionalista; e foi avô de dona Maria Adelaide de Sá Meneses (1826-1878), cujo cadáver incorrupto deu origem ao culto da ‘servinha’ na região de Tabuaço, em Viseu.
Até onde os registros indicavam, José Pinto teve mais quatro filhos – Theresa Amália (1786-1862), Antonio (1787-1864), Ellena (1811-1872) e Bernardo (?-?) – com sua mulher Bárbara Theresa Ribeiro, que faleceu em 1821, como indica o assento de óbito abaixo:
Aos seis dias do mês de outubro do ano de 1821, morreu Bárbara Ribeiro, casada, natural desta freguesia. Recebeu os sacramentos. Foi amortalhada em um hábito preto e enterrada nesta igreja de Nossa Senhora da Assunção. Fez testamento. Deixou pela sua alma 150 missas, [] dizer 40 missas pelas almas de seu pai e mãe, 40 pelas almas de suas irmãs, mais duas ao santíssimo sacramento, mais duas ao anjo de sua guarda, mais duas à [vinha da boa morte] e duas [louvar] na [vinha ] a seu filho Bernardo e sua filha Ellena. E para constar fiz este termo dia, mês e ano ut supra. – o pároco Serafim Duarte dos Santos
Tudo indicava que a possibilidade de encontrar novos fatos relacionados ao doutor José se encerraria com a descoberta do registro de sua morte, até que encontrei o seguinte assento de batismo de seu sobrinho chamado Claudino:
Aqui a transcrição:
Aos seis dias do mês de março nesta, digo, do ano de 1827, nesta igreja de Nossa Senhora da Assunção e colegiada de Barcos, batizei solenemente e pus os santos óleos a Claudino, que tinha nascido a [cinco] dias, filho de Antonio de Araújo e sua mulher Anna Monteiro, sendo primeiro matrimônio da parte de ambos, naturais desta freguesia, neto pela parte paterna de Manoel de Araújo e sua mulher Antonia da Nóbrega, desta freguesia, e pela materna neto de [Cláudio] de Magalhães, desta dita freguesia. Foram padrinhos o doutor médico José Pinto do Souto e sua mulher D. Maria de []. E testemunhas o padre sacristão Antonio Duarte e Francisco José Barradas. E para constar fiz este termo dia, mês e ano ut supra.
Aparentemente, após a morte da mulher Bárbara em 1821, José Pinto do Souto teria contraído núpcias com Maria, cujo sobrenome não foi decifrado no assento acima. Apenas isso explicaria o fato de um assento de batismo de 1827 mencionar outra mulher como sua esposa em lugar da menção à sua condição de viúvo.
O fato de um homem maduro e viúvo buscar outra mulher e se casar não era nenhuma raridade na época, mas o desafio que persiste é como explicar o fato de o assento de óbito de José mencionar que, ao falecer, era viúvo de Bárbara e não de Maria, como se vê abaixo:
Aqui a transcrição:
Aos 20 dias do mês de fevereiro do ano de 1842, morreu José Pinto do Souto Rebello, viúvo que ficou de Bárbara Ribeiro. Não recebeu os sacramentos por morrer de repente. Testou, mas não apresentaram o testamento seus herdeiros, o motivo porque não faço lembrança []. No seguinte dia foi sepultado dentro da igreja de Nossa Senhora da Assunção da vila de Barcos. E para constar fiz este assento que assino. Era ut supra. – o reitor Antonio Rodrigues Pinheiro
Teria sido um engano do pároco? Teria José Pinto, após a perda da mulher, mantido um relacionamento à margem da Igreja com Maria? Até que se possa encontrar o registro de casamento de José Pinto com Maria, ou o óbito desta, o desafio continuará sem solução. De qualquer forma, este caso ilustra mais uma vez a importância de ampliar a pesquisa para além dos antepassados diretos, assunto que já abordei em outro texto.
José Araújo é linguista e genealogista.