Como consequência do conflito que pôs em lados opostos os irmãos d. Pedro (1789-1834), defensor da constituição liberal, e d. Miguel (1802-1866), defensor do absolutismo, centenas de liberalistas sofreram expurgos e perseguições pelos partidários de d. Miguel. Entre as vítimas estava meu primo afastado, o bacharel José Pinto Rebello de Carvalho (1788-1870).
Esse episódio da história de Portugal é descrito no capítulo nove da obra Apontamentos para a História Contemporânea, de Joaquim Martins de Carvalho, publicado em 1868 pela Universidade de Coimbra. Nesse capítulo, apresentam-se as razões alegadas pela junta expurgatória para exclusão de membros do corpo docente e discente daquela instituição.
Cito a seguir o trecho relevante com meus destaques, principalmente aquele em que se apresenta a razão para expulsão de meu primo – a defesa da monarquia constitucional em opisição à monarquia absolutista:
A juncta expurgatoria celebrou 26 sessões, sendo a ultima a 21 de junho de 1824, em que ella deu por concluídos os seus trabalhos, tendo approvado a ultima redacção da consulta, que acompanhava a lista dos lentes, professores, oppositores e empregados da universidade, que no seu parecer deviam ser excluidos desta corporação, porque, a pezar da amnistia concedida pelos decretos de 5 de junho d’ este anno, a juncta—«certa que absolver e perdoar não é o mesmo que habilitar para empregos públicos, e nomeadamente para aquelles que têm annexo o importantíssimo ónus da educação da mocidade, reservou para fundamento de exclusão aquelles factos que arguissem perversidade do coração, ou parecessem avizinhar-se d’este odioso extremo.»
A juncta tomou para fundamento de exclusão: 1.° Os factos que denunciavam falta de religião: 2.° comportamento politico, insistindo especialmente nos signaes de adhesão dados ao proscripto systema constitucional: 3.° insuficiência litteraria fundada na fama publica e constante.
Nesta conformidade foram propostos para exclusão:
[…]
No 2.° artigo—Comportamento politico, morigeração, factos escandalosos, probidade, e desinteresse:
Lentes: – Manuel Pedro de Mello, e Thomaz d’Aquino de Carvalho, por unanimidade.
Professores: — Manuel Sanches Goulão, e Joaquim Cordeiro Pereira, por pluralidade.
Doutores oppositores: — João da Silva Carvalho, e Antonio Ribeiro de Liz Teixeira, por unanimidade; Antonio Alves de Carvalho, Antonio Nunes de Carvalho, e Manuel Antonio Coelho da Rocha, por pluralidade.
Estudantes:— Por unanimidade; Caetano Bonifacio de Queiroz, Francisco Cesário Rodrigues Moacho, Sebastião da Costa Leitão, Manuel da Silva Passos, José da Silva Passos, Francisco de Sena Fernandes, José Pinto Rebello de Carvalho, Bernardo Pereira da Fonseca, José Henriques Ferreira de Carvalho e Miguel Perdigão Caldeira. — Por pluralidade, Leonel Stelita Fernandes de Paiva Manso, Manuel Gomes cia Silva, Antonio Fortunato Martins da Cruz, José Antonio Leal Delgado, Antonio Maria das Neves Carneiro, Gregorio Pessoa Tavares de Amorim, Joaquim Manuel da Costa Fonseca, João Joaquim de Freitas Leal, Antonio Maria de Albuquerque, Jesuino Mendes, José Pinto Tavares Castello Branco, Antonio de Almeida Vasconcellos Castello Branco, José Maria Grande, Francisco Antonio Jardim, Luiz Antonio Villar e Touro, e José Calasans da Fonseca.
Como consequência do expurgo e da perseguição que se seguiu, os partidários da monarquia constitucional fugiram de Portugal e buscaram exílio na Inglaterra. Entre eles estava esse meu primo, que depois iria para a França concluir seus estudos de medicina.
José Araújo é linguista e genealogista.