Você seria capaz de dizer qual o parentesco existente entre João Pacheco de Peralta, Tomás Cordeiro de Carvalho, Miguel Veloso de Carvalho, Joana Pacheco, Ana Muniz de Barcelos e Rosa de Barcelos? O facto de eu ter perguntado já sugere que exista um parentesco, e a repetição de sobrenomes – Barcelos, Carvalho e Pacheco – reforça essa sugestão. Pois eu respondo: eles eram irmãos inteiros, isto é, filhos do mesmo pai e da mesma mãe, que se chamavam João Pacheco Cordeiro e Inês Muniz de Barcelos. João e Inês foram meus octavós, e Miguel Veloso de Carvalho foi meu antepassado direto. A variação de sobrenomes que observamos entre eles era bastante comum no passado e motivo para alguma confusão entre os recém-iniciados na Genealogia. É preciso falar sobre isso.

Em seus assentos de batismo, os filhos de João e Inês foram registrados apenas com seus prenomes – João, Tomás, Miguel, Joana, Ana e Rosa. Os sobrenomes que você leu antes foram provavelmente escolhidos por eles mesmos após o crisma ou quando eram já adultos. Sim, a escolha do sobrenome era feita pela própria pessoa e até mesmo o prenome poderia ser trocado no crisma ou mais tarde. Mulheres, que costumavam ter nomes confessionais, não raramente usavam outras formas desses nomes ao longo da vida. Esse foi o caso de minha tetravó Fermiana, que foi identificada como Fermiana Maria de Jesus nos registros de batismo de seus netos e como Fermiana Maria da Conceição em sua própria certidão de óbito.

Mas e o que dizer da escolha do prenome no batismo? Era uma questão de preferência dos pais? Ou havia algum costume que possa ser depreendido, por exemplo, no caso dos filhos de João e Inês? Havia, sim, um costume: dar aos filhos os nomes dos avós – até bisavós – paternos e maternos, por vezes também de tios e padrinhos. Para revelar esse costume, preciso informar que João Pacheco Cordeiro era filho de Gaspar Cordeiro de Peralta – e neto de Tomás Cordeiro de Peralta – e Maria Pacheco dos Prazeres e que sua mulher Inês Muniz de Barcelos era filha Miguel Veloso de Carvalho e Rosa Maria de Melo Fróis.

Agora já conseguimos identificar as escolhas provavelmente feitas pelo casal: o filho João pode ter recebido o nome de seu pai no batismo e em adulto seguiu com os sobrenomes da família paterna (Pacheco de Peralta); Tomás parece ter recebido o nome do bisavô paterno e seguiu em adulto com uma combinação de sobrenomes paterno (Cordeiro) e materno (Carvalho); Miguel Veloso de Carvalho, meu antepassado, recebeu o nome do avô materno e seguiu em adulto como exato homônimo dele; não se sabe a razão para Joana ter recebido esse nome no batismo, mas pode ter sido escolhida a forma feminina do nome de seu pai, pois em adulta ela usou o sobrenome de sua avó paterna (Pacheco); Rosa deve ter recebido seu nome na pia batismal em homenagem a sua avó materna e em adulta seguiu com os mesmos sobrenomes de sua mãe (Muniz de Barcelos); Ana, última filha de João e Inês de quem temos conhecimento, é um caso ainda mais interessante, pois não se depreende pelos nomes dos (bis)avós maternos – tampouco dos paternos – a razão para escolha de seu prenome, mas ela certamente optou pelos sobrenomes de sua mãe (Muniz de Barcelos).

Batismo de Ana (filha de Tomás Cordeiro de Carvalho)

Aos dezenove de maio de mil setecentos e cinquenta, digo, de mil setecentos e sessenta, nesta igreja paroquial de Nossa Senhora da Apresentação de Irajá, batizei e pus os santos óleos a Ana, filha do alferes Tomás Cordeiro de Carvalho e de sua mulher dona Vitória Joaquina de Alvarenga, ele natural e batizado na freguesia de Santo Antônio de Jacutinga, ela natural e batizada na freguesia de Nossa Senhora do Loreto de Jacarepaguá; neta por parte paterna de João Pacheco Cordeiro [sic] na freguesia de São João do Meriti, e de dona Inês Muniz de Barcelos, natural e batizada na freguesia de Nossa Senhora da Candelária, cidade do Rio de Janeiro; e pela materna de José de Sampaio Almeida […] e dela natural e de dona Antônia de Alvarenga, digo, […] natural e batizado na freguesia de Nossa Senhora do Loreto de Jacarepaguá e dela natural e batizada em Nossa Senhora da Conceição de Sarapuí, freguesia de Jacutinga. Foi padrinho João Pacheco Cordeiro, de que fiz este assento. – o vigário Francisco de Araújo Macedo

O sobrenome Barcelos adotado por algumas das filhas do casal não foi encontrado nos ramos ascendentes deles, mas suspeito que seja um topônimo referente às origens familiares dos avós paternos de Inês Muniz, que talvez fossem naturais desse município português. Sigo com essa hipótese porque existiu na cidade do Rio de Janeiro um homem chamado Manoel Veloso de Carvalho que era natural da freguesia de Santo André de Barcelinhos, no atual concelho de Barcelos. Talvez seja apenas uma coincidência, mas até que se encontrem mais fontes, essa parece ser uma explicação plausível.

Um recém-iniciado que se deparasse com nomes aparentemente tão desconexos como os dos filhos de João Pacheco de Peralta e Inês Muniz de Barcelos talvez tivesse dificuldade para aceitar que fossem todos irmãos inteiros. Por serem comuns casos como o dessa família, sugiro que se observem alguns cuidados:

  1. Busque os nomes e sobrenomes dos avós e até bisavós em busca de repetições;
  2. Reconheça que nem sempre os filhos seguiam com os sobrenomes paternos e as filhas, com os maternos;
  3. Investigue possíveis mudanças de nome confessional feminino ao longo da vida;
  4. Investigue possíveis mudanças de nome após o crisma;
  5. Avalie a possibilidade de que sobrenomes como Barcelos, Coimbra e Lisboa, que parecem simplesmente surgir em determinada geração, possam ser toponímicos e assim talvez indicar a origem geográfica do ramo familiar em que se inserem pela primeira vez.

José Araújo é genealogista.


José Araújo

Genealogista