Tenho observado a persistência de algumas falsas verdades entre pessoas que acabaram de descobrir a Genealogia para o estudo de suas origens familiares. Uma delas – sempre ela – é a de que existiriam sobrenomes característicos de famílias sefarditas e que seriam agrupados sob o guarda-chuva de nomes de árvores ou algo assim. Pois bem, lamento desfazer as ilusões de quem acabou de encontrar uma lista desses supostos sobrenomes, mas essa história não tem nenhum fundo de verdade e vou explicar o porquê.
Primeiro vamos à questão dos sobrenomes verdadeiramente sefarditas. Esses seriam os sobrenomes de pessoas que escaparam da conversão forçada do século XV e se mantiveram dentro da comunidade judaica. Posso citar alguns exemplos, como Abarbanel ou Abravanel, Abulafia, Benveniste, Serruya e Zebulun. Se encontrar algum desses sobrenomes em sua árvore, uma origem sefardita é quase certa, sendo mais provável que algum antepassado recente seu tenha mesmo pertencido a uma comunidade judaica de rito sefardita.
Agora vejamos o que ocorre com sobrenomes portugueses adotados por sefarditas. Aqui tratamos dos sefarditas que foram obrigados à conversão ao catolicismo – passando a ser chamados de cristãos-novos – no século XV e adotaram tradicionais sobrenomes portugueses que passaram a seus descendentes. Posso citar como exemplos desses sobrenomes adotados Albuquerque, Bezerra, Bicudo, Dinis, Fernandes, Nunes e Sardinha. Como se constata, não há nenhum nome de árvore nessa relação. A estratégia correta para saber se um sobrenome de sua família chega a um cristão-novo é associar o sobrenome a uma localidade e para isso se pode usar a ferramenta abaixo, elaborada com o ChatGPT. Apenas esteja ciente de que uma resposta positiva não será uma prova definitiva, o que só se pode obter a partir de um estudo genealógico.
Verificador de Ascendência Cristã-Nova
Digite seu sobrenome:
A outra falsa verdade diz respeito à existência de uma ferramenta a para identificação de ascendência cristã-nova a partir de testes de DNA. Essa suposta ferramenta se chama Índice Sefardita (IS) e já fiz uma análise do potencial dela em sua versão 2 (clique aqui para lê-la). O gráfico comparativo abaixo demonstra como o índice oscilou, em suas versões 1 e 2, na interpretação de possível origem sefardita para mim e quatro primos maternos, sendo que todos nós descendemos dos mesmos cristãos-novos.
O que se destaca no gráfico não é a diferença do IS entre nós – afinal a herança genética é mesmo variável dentro de uma família – , mas sim a discrepância na atribuição de suposta ascendência sefardita feita para cada um de nós por duas versões da ferramenta. O único caso em que houve baixa discrepância foi no de minha prima R.
Faz alguns dias, a empresa que lançou o IS divulgou nas redes sociais o lançamento da versão 3, com a qual pretendeu alcançar maior precisão. Em minha análise, a nova versão apenas introduziu discrepância ainda maior em relação ao que se tinha antes. Em resposta a um usuário, os responsáveis pela ferramenta reconheceram que a atualização detectaria com mais precisão os descendentes do sefardita Antônio Bicudo – de quem eu e meus primos não descendemos. Isso demonstra um viés indesejado, portanto mantenho minha opinião de que se trata de uma diversão e não uma ferramenta com que se deveria contar para orientar uma pesquisa genealógica consistente.
José Araújo é genealogista.