Até que a evolução da Medicina e das condições sanitárias trouxesse uma progressiva queda nos índices de mortalidade infantil, era comum que as famílias perdessem vários de seus filhos na infância, adolescência e até já entrando na idade adulta. É uma dor difícil de mensurar, mas o que devem ter sentido os pais de Anna Maria, tia-avó de minha bisavó paterna, diante da situação que viveram após seu óbito?

E aqui a transcrição do assento de óbito da menina Anna Maria de Macedo, com meus destaques:

Aos 30 dias do mês de dezembro de 1774 anos, faleceu da vida presente Anna Maria, filha legítima de Antonio de Macedo e de Maria da Veiga, naturais e moradores nesta vila de Barcos. Não recebeu os sacramentos da penitência e extrema-unção por se me não dar parte e condenei o dito Antonio de Macedo em mil [réis] pela falta que teve, e vindo nesta na mesma noite falar-me me disse que não dera a dita parte por entender que ainda não tinha completos os sete anos e que pela mesma razão nunca satisfizera ao preceito quadragesimal, tendo já de idade sete anos e onze meses e vinte e cinco dias, como consta no livro dos batizados e que o mesmo dissera ao padre Antonio Nunes, que procurou se tinha a idade para confessar na ocasião e que lhe foi confessar outra filha também doente e informando-me achei que assim o julgava o dito Antonio de Macedo, mas não o absolvo da condenação, que fica para a visita ao arbítrio de sua excelência. Seu corpo foi sepultado dentro desta igreja e por verdade fiz este termo de assento que assinei dia, mês e ano ut supra.

Pelo que se entende da narrativa, segundo a interpretação do pároco, o pai de Anna Maria foi punido por não notificar o estado terminal de sua filha, o que a impediu de receber os últimos sacramentos da Igreja. Por sua falta, teria de pagar uma multa.

Na interpretação do pai, entretanto, a filha ainda ainda não tinha os sete anos completos, o que a impedia de confessar e o desobrigaria de notificar o pároco da iminência da morte.

Embora as informações nos livros paroquiais pareçam sustentar a interpretação paterna, o pároco não se deu por vencido e deixou registrado que a questão seria resolvida pelo bispo.


José Araújo é linguista e genealogista.


José Araújo

Genealogista

2 comentários

Genealogia Prática - Anarquista · 4 de outubro de 2018 às 07:28

[…] pessoal de sua filha Maria da Penha, minha tia paterna. Talvez a questão anticlerical tivesse marcado a família pelos séculos, quem […]

Precipitação – Genealogia Prática · 6 de fevereiro de 2022 às 10:06

[…] por seu cunhado – irmão de sua primeira mulher – que parecia ser mesmo anticlerical. O segundo caso está relacionado a um parente distante que questionou a necessidade de pagar multa à Igreja […]

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