O meu pai era paulista
Meu avô, pernambucano
O meu bisavô, mineiro
Meu tataravô, baiano


Paratodos – Chico Buarque

Talvez poucas pessoas tenham a possibilidade de traçar a própria ancestralidade como o compositor Chico Buarque, cuja família tem suas raízes bem documentadas na obra Buarque. Uma Família Brasileira. Ensaio Histórico e Genealógico. A maior parte das pessoas pode apenas, e com alguma sorte, saber os nomes de seus bisavós e algumas histórias ou anedotas sobre seus antepassados.

Quem dispõe de tempo e alguns recursos, no entanto, pode superar as limitações das memórias de seus pais e avós e fazer uma busca por documentos que talvez já estejam disponíveis em bases de dados on-line ou ainda, mais recentemente, tentar contornar a falta desses documentos por meio de testes genéticos.

A revista Galileu deste mês traz uma matéria interessante sobre esses testes, ressaltando o potencial de seus resultados não apenas na complementação dos estudos genealógicos tradicionais, mas também na superação das limitações inerentes a ele – justamente quando os documentos antigos não mais existem ou estão em condição que não permita a extração de informações. A matéria traz relatos de pessoas que fizeram esses testes – leia um deles aqui – e das descobertas que fizeram sobre suas famílias, algumas bastante surpreendentes.

O que a matéria não diz, entretanto, é que os resultados dos testes nem sempre são conclusivos no nível desejado pelos clientes, quer porque cada empresa utiliza uma tecnologia e metodologia diferente para atribuição da ancestralidade, quer porque os parentescos eventualmente apontados entres os clientes podem ser remotos, situando-se além do tempo genealógico, aquele que pode ser confirmado por documentação, ainda que muito antiga.

Fiz alguns desses testes – DNA mitocondrial, para linhagem exclusivamente materna; DNA do cromossoma Y, para linhagem exclusivamente paterna; DNA autossômico, para percentuais de heranças genéticas de ambas as linhagens – com duas empresas bastante conhecidas e tive ao uma grande surpresa: no ramo materno, acreditava que minha avó fosse portuguesa, porém seu DNA mitocondrial sinalizava origem africana bastante remota. Isso só poderia significar que ela descendia de uma africana escravizada no Brasil.

Haplogrupos do mtDNA – Fonte: Nature

No ramo paterno, outra surpresa: o teste revelou uma origem no cáucaso, e não uma herança europeia tradicional. Os parentescos até o momento revelados pela empresa são predominantemente da Turquia e da Geórgia, mas também, mais recentemente, do norte da Europa, com ao menos dois casos de possíveis ancestrais nórdicos.

Haplogrupo G-M406 – Fonte: FamilyTreeDNA

O ancestral comum entre mim e esses outros clientes deve ser muito remoto, portanto não tenho a expectativa de descobri-lo em documentos, pois provavelmente ele viveu em uma época quando não se fazia registro escrito de nascimento, casamento ou óbito.

Para saber mais sobre os testes genéticos, recomendo a leitura do e-book específico na coleção Genealogia Prática.


José Araújo é linguista e genealogista.


José Araújo

Genealogista