Existem em minha árvore vários ramos maternos ainda pendentes de esclarecimento pela existência de filhos naturais de quem se conhecem apenas as mães. Um desses casos eu acredito ter esclarecido recentemente pela revelação da paternidade de meu bisavô Artur Rabelo Guimarães no cidadão português Antônio Rabelo Guimarães (1846-1888), natural da freguesia de Queimadela, no município de Fafe em Braga. Ao mesmo tempo, a mãe de Artur segue sendo uma mulher de paternidade desconhecida, assim como persiste o desconhecimento sobre a identidade do pai de Argemira, minha bisavó, esposa de Artur. Algo parecido ocorre no ramo de meu avô materno: seu pai João Pereira Belém era filho de Pedro Gomes de Moraes e uma mulher chamada Joaquina, com quem Pedro nunca se casou e cuja filiação completa é um enigma. João Pereira Belém se casou com Teodora Maria da Conceição, filha de Felipe Rangel e uma mulher que ora surge como Maria Laurinda (ou Lucinda ou ainda Leonarda) da Misericórdia e ora surge como Maria Gaspar, ambos de filiação ignorada. Faltam livros paroquiais da freguesia de Santo Antônio de Jacutinga, no Rio de Janeiro, onde essas pessoas viveram, pelo que tento recorrer aos testes de DNA autossômico para esclarecer essas filiações e continuar a construir minha árvore. Este texto traz uma reflexão a partir do que sei dos documentos disponíveis e do que o DNA me revelou até o momento.

Ascendências com filiação ignorada

Um fato interessante revelado pelo DNA foi a existência de ao menos cinco correspondências de DNA (matches) chamadas Camilla, Evelyn, João, José e Nelly, que compartilham DNA comigo e dois primos maternos meus – WILP e THAS – que também fizeram o teste autossômico. WILP é bisneto tanto de João e Theodora quanto de Artur e Argemira, enquanto THAS é bisneta apenas de Artur e Argemira, apresentados na árvore acima. A partir da descoberta desses matches e da constatação de que a quantidade de DNA compartilhado entre nós – acima de 28 cM (centimorgans) – não era desprezível, decidi investigar mais a fundo esse compartilhamento de DNA. Inicialmente, me dediquei a elaborar as árvores genealógicas de Camilla, Evelyn, João, José e Nelly, e o resultado, que se vê na imagem abaixo, não poderia resultar mais satisfatório, pois revelou que quatro deles três têm uma ascendência comum no casal Antônio da Silva Amaral (1808-1874) e Leocádia Clara de Souza (1819-1885, datas estimadas), que viveu na freguesia de Santo Antônio de Jacutinga, a mesma onde vivia minha família materna no mesmo período. Dois deles, por sua vez, têm ascendência nos bisavós de Antônio da Silva Amaral.

Matches com ascendência comum

Se havia antepassados em comum claramente identificados, deveria ser possível demonstrar essa ascendência comum na análise fina do DNA. Foi com esse objetivo que, por meio da ferramenta de triangulação de cromossomos da plataforma MyHeritage, descobri que eu, a match Camilla e minha prima THAS compartilhamos um segmento de 8,6 cM no cromossomo 2, na posição genômica 45961606 – 53439629, o que indica que herdamos esse segmento do mesmo antepassado comum. Segundo a ferramenta Chromosome Painter da plataforma FamilyTree DNA, o segmento que eu tenho nessa posição tem origem no sudeste europeu e na Europa ocidental, o que sugere uma origem portuguesa. A mesma ferramenta de triangulação revelou que eu, o match João e meu primo WILP compartilhamos um longo segmento de 62,8 cM no cromossomo 18, na posição genômica 11879825 – 70176009. Essa maior quantidade de DNA compartilhado talvez se deva ao fato de que Stella, avó de João, descendia duplamente do casal Manoel de Souza Dias e Leonor Nogueira do Amaral, que foram bisavós de nosso suposto antepassado comum, o tenente Antônio da Silva Amaral. Os pais de Stella – Joaquim Soares de Moura e Luiza Clara da Silva Amaral – eram ambos trinetos de Manoel e Leonor. Segundo a ferramenta Chromosome Painter da plataforma FamilyTree DNA, grande parte do segmento que eu tenho nessa posição tem origem na Europa meridional, o que igualmente sugere uma origem portuguesa. As matches Evelyn e Nelly – ambas descendentes de Maria da Silva Amaral (1840-1894) – não têm seu DNA em plataforma que permita análises semelhantes, mas a primeira compartilha 26 cM comigo e 19 cM com minha prima THAS, enquanto a segunda compartilha o dobro – 52 cM – apenas comigo, talvez porque haja menos gerações entre nós, com maior acúmulo de DNA comum herdado de nosso suposto antepassado Antônio da Silva Amaral.

A identificação de um casal de ascendentes comuns para os três matches e de segmentos de DNA triangulados em cromossomos diferentes entre mim, eles e meus primos não revela que eu e meus primos sejamos descendentes diretos desse casal. Talvez descendamos apenas de um deles – Antônio da Silva – , talvez de um dos irmãos dele, talvez mesmo de um dos irmãos de Leocádia , a esposa dele. Visto que (a) o casal também parece estar na ascendência da prima THAS – que descende apenas de Artur, filho de Julinda, e Argemira, esta filha de pai desconhecido – ; (b) que a match Evelyn é correspondência comum comigo e THAS; (c) que Julinda tem um sobrenome composto – Dias Seabra – diferente dos demais; (d) e que foi encontrado em um homem com esse sobrenome na cidade no período em que Julinda vivia, minha suspeita é de que a relação do casal Antônio e Leocádia possa ser com o pai desconhecido de Argemira, mulher de Artur. Mas tudo isso ainda necessitaria ser confrontado com mais provas documentais e/ou mais matches triangulados.

Para fim de sistematização, seguem as estratégias recomendadas em casos similares:

  1. Faça um teste genético próprio;
  2. Teste também outros parentes próximos – tios, primos – do mesmo ramo em que há um antepassado de filiação ignorada;
  3. Verifique a existência de matches que são comuns consigo e entre eles próprios, sugerindo a existência de um ascendente comum;
  4. Busque segmentos trianguláveis entre todos;
  5. Analise a origem étnica dos trechos dos segmentos triangulados por meio de um chromosome browser;
  6. Elabore as árvores dos matches com quem se tenham observador segmentos triangulados;
  7. Analise todas as árvores para identificar prováveis candidatos a pais do antepassado de filiação ignorada.

Nota: Agradeço à prima e genealogista Cassia Carauta pela indicação do nome de Pedro Dias de Seabra como possível pai de Julinda Dias Seabra. Essa pista será de grande ajuda na busca da identidade do pai dessa minha trisavó materna.


José Araújo é genealogista.